terça-feira, 31 de outubro de 2017

A verdadeira satisfação e alegria


A personalidade humana não é jamais autossuficiente. Ela não pode ser autônoma. Nem conhecer a si mesma a partir de si mesma.

“Quando eu era menino, falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino. Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido”

A personalidade humana é conhecida pelo caráter. O caráter é a qualidade distintiva da pessoa, o conjunto de traços particulares, face, fisionomia, natureza (2 Co 4:4), o modo de ser do indivíduo, firmeza e coerência, propriedade, adequação, domínio próprio (2 Co 3:18), e pela qualidade especial do batismo (1 Pe 3:21).

Cristo é a água essencial da vida, transformadora e purificadora do caráter humano por meio do poder do seu sangue mediante a ação da Palavra e pelo Espírito. Ele é o pão substancial da vida, que nutre a alma e corpo, a própria Palavra e Espírito.

“Jesus lhes disse: "Eu lhes digo a verdade: Se vocês não comerem a carne do Filho do homem e não beberem o seu sangue, não terão vida em si mesmos. Todo o que come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Pois a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira bebida. Todo o que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Da mesma forma como o Pai que vive me enviou e eu vivo por causa do Pai, assim aquele que se alimenta de mim viverá por minha causa. Este é o pão que desceu do céu. Os antepassados de vocês comeram o maná e morreram, mas aquele que se alimenta deste pão viverá para sempre" (João 6:53-58)

O diálogo com Deus nos identifica com a unidade e pluralidade do ser de Deus e nos capacita à formação de uma identidade pessoal e comunal.

“Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação” disse o Apóstolo Paulo em sua carta aos Filipenses 4:11,13). A palavra “contente” (altarkes) aqui é a mesma usada em 2 Co 9:8 (autarkeia), e diz respeito à uma autossuficiência que provém da autossuficiência de Deus. A palavra suficiência (hikanotes) em 2 Co 3:5 significa capacidade, habilidade, competência. Assim, o que realmente torna-nos suficientes (“autárquicos”) é a derivação de poder do caráter divino mediante a união e participação com o seu Filho (GOMES; 2017, p. 241).

Assim como o Filho veio para satisfazer a vontade do Pai, assim o homem encontra a si mesmo em Cristo quando se satisfaz a fé na vontade graciosa de Deus. O homem que se declara autossuficiente não precisa de Deus, pois ele está sempre buscando algo que possa lhe trazer alegria a satisfação, porém, se alguém não crer a ponto de comer a carne do Filho do Homem e não beber o seu sangue, não terá vida em si mesmo. Sofrerá o peso da glória de Deus em justiça sobre o pecado e será esmagado ao chão sob o peso de suas insatisfações e frustrações (GOMES; 2017, p. 243).

 A glória de Deus é pesada (kavod, hb., glória, peso ou pesado), mas a glória de Deus revelada em Cristo se torna leve para o homem no reflexo da beleza de Cristo. Esta mensagem é escândalo e loucura para os que se perdem (1 Co 1:21), a autoglorificação não produz só escândalo, mas traição. Muitas pessoas desistiram de ouvir a Jesus porque não podiam olhar para ele de frente. Essas pessoas passam a vida em busca do contentamento, mas o segredo da vida não está na busca, mas no encontro, e este encontro é com Cristo.

Quando nos isolamos de Deus, como seres autônomos, só nos resta desregramento moral e a frustração. Tudo tem a ver com o ponto de referência, e Deus é o nosso ponto de referência, como seres teorreferentes.

Jesus quando encontrou com a mulher samaritana na cidade de Sicar na região de Samaria, ocorreu um diálogo sobre a água viva (Jo 4). Jesus estava cansado, e sentou junto a fonte de Jacó, e nisso aproximou-se uma mulher samaritana que vinha à fonte para buscar água. Jesus pediu-lhe: “Dá-me de beber” (Jo 4:7). A mulher mostrou surpresa com o início da conversa por causa do preconceito religioso que havia entre os judeus e samaritanos. No Antigo Testamento lemos que a região de Samaria foi atacada pelo Rei da Assíria, os israelitas foram levados cativos para a Assíria, e sua descendência foi da gente pagã da terra do cativeiro. O Senhor demonstrou que o problema não estava na controvérsia entre judeus e samaritanos, mas na necessidade de transformação e da purificação do novo nascimento. Jesus foi ao encontro da necessidade da mulher samaritana por meio da exibição de sua própria necessidade humana: “Dá-me de beber”.

As pessoas falham na localização da verdadeira fonte e na identificação da verdadeira necessidade. Todos os meios e tentativas de suprir suas próprias necessidade são frustradas, pois “não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes?” (Mt 6:25).

A mulher samaritana disse: “Senhor, dá-me dessa água para que eu não mais tenha sede, nem precise vir aqui busca-la” (Jo 4:15). A resposta de Jesus não pareceu de imediato responder à sua necessidade: “Vai, chama teu marido e vem cá” (v.16). Jesus está bem consciente de que todos possuem carência últimas de vida, que transcendem as necessidades imediatas. Jesus está elevando os olhos da mulher samaritana acima do “aqui e agora”. Ele volta o olhar dela para questões eternas (“uma fonte a jorrar para a vida eterna”).

“Tudo fez formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim” (Ec 3:11).

A expressão do desejo da mulher samaritana implicava sede geral do seu coração. Corpo e alma tinham sede satisfação, e o Senhor respondeu à sua necessidade mais profunda, pois só ele conhecia seu coração.

A mulher samaritana responde: “Não tenho marido”(v. 17). A mulher tinha uma vida irregular, não somente pelo número de companheiros que havia tido (cinco maridos), mas pelo homem atual que se relacionava e que não era seu marido. Jesus pressiona sua consciência sem acusá-la, e acha um ponto positivo na honestidade da mulher (“Bem disseste”). A sede de relacionamentos da mulher samaritana era grande, maior do que a sede de água. Da mesma forma como buscava água na fonte de Jacó, a cada dia, a mulher samaritana tinha buscado satisfação relacional em alianças com homens de forma irregular, eram fontes rotas que não retinham água (Jr 3:13).

Deus é o nosso único ponto de referência. Nossa personalidade é analógica, se não refletirmos a glória de Deus, refletiremos trevas à guisa de luz (Mt 6:22,23); nossa personalidade é pactual, se não compactuarmos com Deus, faremos aliança de aproximação com os homens; nossa personalidade é dialogal, se não falarmos com Deus por meio da sua Palavra e da oração, ouviremos e responderemos a vozes de ídolos. A religiosidade idólatra precisa sempre de um referencial visível para a fé autocentrada.

A fé centrada no homem e nas coisas do homem, e não em Deus, se define como “fé na fé”, isto é, como uma certeza de coisas que se presumem em função da convicção de fatos apenas observados, e ela mesma servirá de maldição (Hb 6:7,8). É a fé na graça que dá ao homem o referencial divino para o conhecimento de Deus, de si mesmo, e do outro, e a observação e a explanação adequada da realidade presente e por vir (GOMES; 2017, p. 201).

Se Deus não for nosso ponto de referência, outra coisa o será, a busca por satisfação em relacionamentos, carreira profissional, currículo acadêmico, terminarão em frustração e insatisfação, pois a pessoa que se declara autossuficiente nunca sentirá a verdadeira alegria e satisfação, pelo contrário, sofrerá o peso da glória de Deus em justiça sobre o pecado, pois fomos criados para refletir a imagem de Deus, para glorificá-lo, mas sem Cristo, o peso será insuportável.

O segredo da verdadeira alegria e satisfação não está naquilo que você tem buscado para o seu contentamento, mas naquilo que você tem evitado, o encontro frente a frente com a verdadeira fonte que revela a verdadeira necessidade do seu coração, Cristo Jesus!

REFERENCIAL TEÓRICO:

GOMES, Wadislau Martins. Personalidade Centrada em Deus. Brasília: Monergismo, 2017.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Estultícia vs. Sabedoria


"Onde, porém, se poderá achar a sabedoria? Onde habita o entendimento?
O homem não percebe o valor da sabedoria; ela não se encontra na terra dos viventes”
(Jó 28:12,13)

A sabedoria é o conhecimento de Deus e do homem como criatura teorreferente, e, estultícia, a sabedoria humana na tentativa de considerar o homem em isolação de Deus.

A estultícia é oposta à sabedoria de Deus. No dicionário, o estulto é o homem tolo, néscio; na Bíblia, é quem não considera Deus. É um falsificador da sabedoria, um verdadeiro construtivista.

Características da estultícia no homem decaído (rebelião, reversão e inversão): a estultícia mostrará a rebelião contra Deus e contra tudo; a reversão do seu pensamento contra o pensamento de Deus; e a inversão da centralidade de Deus pela do próprio homem.

O estulto tem uma tendência para reestruturar a vida sempre com motivação de autojustificação e com base na própria estultícia. Não adianta trabalhar a estultícia para melhorar o estulto (terapia, atualização e etc), antes é preciso direcioná-lo ao amor à sabedoria (GOMES; 2017, p.167) (Pv 26:4-5).

1) A estultícia é ingênua (0-2 anos; Pv 22:16)
A criança nasce portadora do pecado e tende naturalmente para o engano.

2) A estultícia é aprendida (2-7 anos; Pv 14:18; 17:28)
A criança desenvolve a estultícia, aprendendo errado o certo e, “certo” o errado.

3) A estultícia é aplicada (6-13 anos; Pv 14:8; 12:23)
O menino ou menina passa por um período de prática do “saber privado” daquilo que adquiriu ou experimentou.

4) A estultícia é frustrada (12-20 anos; Pv 16:22; 19:3; 1 Co 8:2)
O adolescente ainda não sabe a maneira conveniente do saber e percebe a contradição de suas teorias e a prática da vida.

5) A estultícia é reestruturada (18-30 anos; Pv 14:24; 26:11)
O adulto busca mudanças que, por falta de referencial, acaba reproduzindo mais estultícias.

6) A estultícia é estabilizada (30-60 anos; Pv 15:14,21)
Na idade madura a pessoa se sente “velha demais” para mudanças, ou confortável com a própria estultícia.

7) A estultícia é falida (60 anos...) (Pv 27:22; Ec 12:1)
Nos últimos anos a pessoa vive uma mistura de sentimentos de humilhação e orgulho.

As raízes do medo de punição, rejeição e falha estão ligadas aos ídolos do coração que produzem a estultícia. Por sua vez, o amor a Deus expulsa o medo e confere sabedoria arraigada ao amor de Deus e à sua Palavra (GOMES; 2017, p.173).

Como direcionar à estultícia ao amor à sabedoria?

O apóstolo Pedro escreveu sobre essa sabedoria:

“Seu divino poder nos deu todas as coisas de que necessitamos para a vida e para a piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude. Por intermédio destas ele nos deu as suas grandiosas e preciosas promessas, para que por elas vocês se tornassem participantes da natureza divina e fugissem da corrupção que há no mundo, causada pela cobiça. Por isso mesmo, empenhem-se para acrescentar à sua fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento o domínio próprio; ao domínio próprio a perseverança; à perseverança a piedade; à piedade a fraternidade; e à fraternidade o amor. Porque, se essas qualidades existirem e estiverem crescendo em suas vidas, elas impedirão que vocês, no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo, sejam inoperantes e improdutivos. Todavia, se alguém não as tem, está cego, só vê o que está perto, esquecendo-se da purificação dos seus antigos pecados. Portanto, irmãos, empenhem-se ainda mais para consolidar o chamado e a eleição de vocês, pois se agirem dessa forma, jamais tropeçarão, e assim vocês estarão ricamente providos quando entrarem no Reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2 Pedro 1:3-11).

Vejamos alguns princípios que servem como antídoto para a estultícia, versos 3 a 8 de 2 Pe 3.

1) Associação da fé à virtude (pensamento e ação; bondade moral. Excelência, modéstia, pureza), significando amar a Deus, agradar a Deus e servir a Deus.

2) Aplicação da fé e virtude ao conhecimento de Deus e sua Palavra, de maneira inteligente e obediente. Esse conhecimento gera domínio próprio.

3) O domínio próprio, por sua vez provoca perseverança, ou seja, constância e capacidade para continuar através de problemas e situações.

4) Aquele que persevera, obtém a piedade, isto é, respeito, reverência e bondade diante de Deus.

5) A piedade move fraternidade, ou respeito em relação ao próximo.

6) A fraternidade ensina o amor cristão. A capacidade para amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como e acima de si mesmo.

Nenhum homem ou terapia jamais poderá transformar a pessoa à imagem de Cristo. Nenhum homem ou tratamento psicológico jamais poderá purificar a pessoa para o pacto com Deus (GOMES; 2017, p.150).

A psicologia secular desconhece a verdadeira natureza humana, sua antropologia de modo geral, além de ser autorreferente é fundamentada em observações de autores que não acreditam em Deus.

Conforme observou Jay Adams: “Não me oponho à psicologia ou a psicólogos como tais...Minhas objeções se referem aquilo que chamam de psicologia clínica e aconselhamento psicológico em que muito do que é feito, não considero, de maneira nenhuma, ser terreno da psicologia".

A psicologia não tem poder para transformar e purificar a vida de uma pessoa, qualquer alívio proposto é momentâneo, por isso poderá ser enganoso. As propostas seculares tentam melhorar o estulto, pois o fazem no contexto de uma religião secular, rebelde em termos de supressão da verdade de Deus, reversa em termos dos pensamentos contra os pensamentos de Deus, e inversa no sentido do seu antropocentrismo (GOMES; 2017, p. 166).

A estultícia humana impõe sistemas de filosofia, antropologia, sociologia e psicologia calcados na observação humana. A sabedoria vem do conhecimento de Deus, do homem como um ser teorreferente.

REFERENCIAL TEÓRICO:

GOMES, Wadislau Martins. Personalidade Centrada em Deus. Brasília: Monergismo, 2017.

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